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  • fernanda cruz de aragao coelho

Tragédia della vita

Hoje recebi a primeira dose da vacina contra a peste. Não fiz a clássica foto que muitos têm registrado em suas redes sociais; escolhi esta imagem acima para marcar o momento. Ela foi feita por mim há poucos dias numa esquina qualquer da nossa Fortaleza, numa série que intitulo como “Tragédia dela vita”.

Já vacinada, na caminhada solitária à procura do carro que, pra variar, havia perdido no meio de tantos outros, sol a pino na moleira, fui arrebatada pelo fluxo aleatório dos meus pensamentos e me fixei naquela cena de rua, de muitas que havia fotografado ou visto: um jovenzinho malabarista de laranjas, a máscara que usava era tão somente a de palhaço, pintada com tinta guache, já borrada pelo suor. Ao fundo vê-se a bandeira do Brasil esticada, essa mesma, tão aguerrida por alguns. Tanto a figura do palhaço quanto a bandeira brasileira guardam ambiguidades. As duas juntas numa só imagem, neste momento de horror, me impactam. Cada um faz a leitura da cena a partir da lente de sua subjetividade. Quando é que esse menino terá acesso à vacina? Se estava na escola, quando retornará? Será que retornará? Sonhos, futuro, oportunidades? O que lhe tem sido fadado é a perpetuação do mesmo destino que seus ascendentes tiveram. Nada mais no horizonte verde-amarelo.

Diz-se que quando choramos, não choramos só pelo que está doendo no momento “agora”, mas por todas as dores já sentidas, as de dente, as cólicas, os amores perdidos, as dores da alma. Eu hoje e por tantas vezes, me senti tão desamparada como aquele menino “malabarista da vida”. Somos todos, com a devida distância, aquele menino, em meio a este caos político e social. Sinto um mal estar descomunal, mas a convicção de ter que resistir à altura também. Sigamos com coragem.

A bandeira deste país tem que estar a meio mastro.


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